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| Gratuidade
no Estacionamento Reservado 04-agosto-2009 Caso pudesse escolher, responda rápido: - Iria preferir ser atendido antes dos outros numa longa
fila para serviços públicos, - Iria preferir ter descontos na compra de um automóvel novo, mas que não lhe permitisse sequer entrar ou sair sem ajuda, ou não ter uma deficiência? - Iria preferir ter uma vaga reservada para seu veículo
no local de trabalho e noutros poucos pontos de seu
interesse, - Iria preferir gratuidade compensatória sobre o pagamento de impostos e taxas para uso de serviços públicos inacessíveis, ou não ter uma deficiência? Em todas as situações listadas acima, o fator “deficiência” foi colocado de modo antagônico às situações desejáveis para todos. Entende-se por esse termo os problemas de utilização do espaço ambiental devido às deformações físicas e estéticas além das disfunções para o desempenho de atividades considerado comum para todos. Na maioria das vezes, a expectativa é de que os leitores prefiram abrir mão dessas situações caso isso implique em viver uma deficiência temporária (sem tempo definido) ou permanente. Por outro lado, pode-se entender melhor sobre o esforço social de compensação para que as pessoas com deficiência tenham oportunidades equiparáveis às de outros cidadãos. Afinal, para as pessoas já com deficiência, as perguntas acima não representam opções. A deficiência é a certeza de existir uma desvantagem social que se torna mais implacável pela falta de situações compensatórias. O serviço gratuito de estacionamento reservado em vias
públicas para veículos que transportam pessoas com deficiência tem sido assunto
polêmico que evidencia falso entendimento dos conceitos que dão suporte ao
movimento pela inclusão social. A partir dessa primeira década do século 21 até o Decreto
5296-2004, começaram a surgir áreas de estacionamento reservado em programas-piloto,
sendo que nesses casos o número de vagas começou a crescer em função de uma
demanda crescente, apesar do desrespeito e da impunidade com que outros
motoristas tendem a invadir esse espaço. De fato, toda medida de benefício social em favor de pessoas com deficiência, de modo geral, tem sido interpretada pelas pessoas distantes do problema de mobilidade como um artifício de protecionismo e de discriminação com relação às outras pessoas consideradas normais, cuja deficiência seja temporariamente inexistente, ou mesmo, não aparente. A interpretação cada vez mais expressa abertamente é de que pessoas com deficiência tem tratamento diferencial como um privilégio, uma regalia, em comparação às outras pessoas que também sofrem com a precariedade das condições de uso do espaço público no meio urbano mas que não podem usufruir de trunfos políticos. Sendo um privilégio, pode ser considerado injusto a partir de uma referência de que justiça deva ser somente obtida pelo tratamento de igualdade para todos, mesmo que essa igualdade implique em se nivelar por baixo a partir do referencial de quem não tem deficiência. Contudo, os princípios internacionais de reabilitação na comunidade que orientam os países signatários da Organização das Nações Unidas, (entre esses está o Brasil), a verdadeira justiça ocorre quando oportunidades iguais podem ser obtidas pelo tratamento desigual e compensatório em relação às desigualdades que caracterizam a realidade da deficiência entre os indivíduos. Noutras palavras, somente oferecendo benefícios comparáveis à gravidade dos problemas individuais no lidar com uma deficiência é que se pode obter um equilíbrio. Assim, sem deturpar os esforços de melhoria do sistema para todos e como um todo, o enfoque do problema de pessoas com deficiência merece atenção como um índice muito sensível de medição da melhoria de qualidade a partir do respeito à dignidade e ao potencial de realização individual. No caso do serviço gratuito de estacionamento reservado
para acessibilidade, 1- As pessoas beneficiadas tem problemas graves de mobilidade que as impedem de se locomover com autonomia, espontaneidade, e de modo independente pelas calçadas, travessias e ruas da cidade para cumprir com compromissos ou alcançar seus objetivos, a não ser que haja acessibilidade por meio de superfícies planas, niveladas e regulares de áreas disponíveis, interligadas, bem dimensionadas e bem sinalizadas. 2- As pessoas beneficiadas usam o veículo particular como única forma de transporte pessoal, uma vez que não conseguem usar rotineiramente o transporte público individual ou coletivo e não conseguem usar as vias urbanas como descrito em (1). Deve-se observar neste aspecto que o veículo particular se torna um equipamento de tecnologia assistiva, como um vetor de acessibilidade por entre espaços repletos de barreiras e seu uso tende a ser mais importante ainda em cidades com topografia acidentada que impede rotas acessíveis na caminhada pelas calçadas, travessias e ruas. 3- O uso do estacionamento deve ser gratuito para servir de estímulo à espontaneidade pela maior mobilidade das pessoas com deficiência, rompendo um ciclo de exclusão e de isolamento. Além disso, a gratuidade impede que os problemas de mobilidade repercutam numa carga financeira maior para pessoas que sofrem com o alto custo por adaptações em sua vida diária, pessoal e profissional. 4- O veículo deixado no estacionamento reservado por motoristas com deficiência deve permanecer no local enquanto durar a atividade que motiva sua utilização quer seja para o trabalho, lazer, cultura, etc. Somente assim, poderá cumprir os objetivos dessa atividade em termos de produção, de contribuição financeira, de desenvolvimento cultural, de aprimoramento intelectual e de socialização. 5- O uso do estacionamento por pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida que não dirigem deve ter período relativo e proporcional ao esforço de embarque, desembarque e de acompanhamento do motorista dessas pessoas ao local de interesse, sendo que nesses casos o veículo pode ser retirado e estacionado noutra vaga caso haja disponibilidade em menor tempo. Assim, o credenciamento das vagas de estacionamento pode ser diferenciado em função de prover serviços compatíveis com as necessidades de quem dirige e de quem é passageiro. O serviço de operação e de fiscalização do estacionamento reservado para acessibilidade é compatível com o reconhecimento de que a verdadeira inclusão social de pessoas com deficiência ocorre por transformações no sistema de estacionamento pago em trechos de área plana de vias públicas de modo a conter vagas especiais para uso gratuito e que acolham situações diferenciadas de respeito às necessidades dos cidadãos. As transformações compreendem a seleção de vagas específicas cuja característica de localização, de composição de seus elementos junto à calçada, de forma, de tamanho, de declividade, e de sinalização atendam às exigências normativas para espaços acessíveis às pessoas com sérios problemas de mobilidade. Nos centros urbanos com desenvolvimento já consolidado, essa transformação implica ainda no gerenciamento de reformas das vias públicas para que a prefeitura, seus órgãos operacionais e a iniciativa privada construam rampas de baixa declividade além de efetuarem a marcação padronizada dos espaços acessíveis. Tais transformações não devem acarretar custo direto para o público beneficiado. Caso contrário, não se pode falar de justiça social em tais situações. Imaginem, por exemplo, se uma pessoa com deficiência tivesse que pagar por um pedágio toda vez em que passasse por uma rampa de rebaixo da guia ou meio-fio da calçada. Imaginem se uma pessoa que lê com os dedos tivesse que pagar a mais para entender escolhas num cardápio em braile. Imaginem se uma pessoa que se comunica com as mãos e vê televisão com legendas fosse cobrada pela adequação dos novos televisores para essa nova tecnologia... Devemos ser contra a eliminação da gratuidade do serviços de operacionalização de estacionamento reservado para acessibilidade. Para tanto, temos argumentação que critica e rejeita interpretações mal formuladas sobre o problema.
Os serviços devem ser ainda viabilizados pela destinação de acréscimos substanciais do IPTU para proprietários que deixem de adaptar suas calçadas com rampas acessíveis e sinalização adequada.
:: 1%, ou mais,
deve equivaler ao número mínimo de vagas de estacionamento totalmente
acessíveis para atender aos motoristas com deficiência que fazem uso de
seu veículo como equipamento de mobilidade para longa permanência (principalmente
no trabalho), e :: 1%, ou mais, restante deve equivaler ao número mínimo de vagas de estacionamento para uso em períodos intermitentes de curta permanência por pessoas não-motoristas (deficientes visuais, deficientes físicos com atendentes, deficientes mentais acompanhados, idosos acompanhados) com problemas de mobilidade, sendo credenciados para o veículo permanecer ocupando a vaga somente durante embarque, desembarque e acompanhamento ao local de destino.
Concluindo, a gratuidade nos serviços de reserva de estacionamento credenciado para acessibilidade em vias públicas é um ponto fundamental que justifica o comprometimento da ação pública do Brasil nos âmbitos federal, estadual e municipal para promover a reabilitação em comunidade e a decorrente inclusão social de pessoas com deficiência segundo a convenção internacional das Nações Unidas. Trata-se de um princípio moral em que a garantia da igualdade não é definida pelos baixos parâmetros de atendimento das necessidades da população como um todo. De fato, a igualdade é defendida pelo tratamento de desigualdades numa base de compensação de modo que as pessoas com deficiência tenham oportunidades de compartilhar de condições dignas na qualidade de vida, aspirando e exercendo maior participação social. Qualquer defesa pela abolição da gratuidade nos serviços públicos de gerenciamento e de fiscalização do estacionamento reservado para acessibilidade faz recair mais uma vez sobre as pessoas com deficiência o pesado ônus de viver entre barreiras físicas e atitudinais frente à falta de acessibilidade na infra-estrutura básica do meio urbano. Por isso, a gratuidade deve ser mantida como um dos mecanismos eficazes de inclusão. O número percentual definido pela legislação e normas técnicas é um referencial mínimo que leva em consideração aqueles que usam o veículo como equipamento compensatório por graves problemas de mobilidade reduzida. Este referencial pode e deve ser ajustado para mais em função da topografia das regiões na cidade e em função de uma distribuição compatível entre tipos de estacionamento, conforme padrões de permanência. Em todo o caso, deve-se considerar que esse número pode crescer à medida que mais pessoas necessitem desses serviços. Deve-se ainda reconhecer que as características das vagas acessíveis devem atender às normas técnicas da ABNT e ao Código do Consumidor. A ameaça de falência do sistema deve ser combatida por incentivos para um transporte público e coletivo que retirem o excesso de veículos do centro da cidade, e para uma participação ativa de pessoas que entendam a acessibilidade de pessoas com deficiência como um símbolo de ética de toda a população. Assim, para aferir o sucesso de um desenvolvimento sustentável no transporte e espaços de interesse público, os últimos veículos estacionados nos centros das cidades devem corresponder aos veículos de motoristas ou de passageiros com deficiência relativa aos problemas de mobilidade. Isso significará que a população como um todo se utilizará de alternativas viáveis, atraentes, e compatíveis com suas necessidades. |
Escola de Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais 29-01-2010